Tecnologia não deve ser usada para reduzir empregos
Postado em 9 de outubro de 2017
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O que há anos se previa já é concreto no nosso dia a dia. É inevitável: hoje, não é mais necessário ir até uma agência física para tirar extratos ou pagar contas. O novo modelo dos bancos já se consolidou no Brasil, e os impactos desta mudança no emprego do bancário são visíveis, principalmente no setor de back office.
A primeira revolução foi a inserção das máquinas a vapor em substituição ao trabalho manual. Depois, a eletricidade permitiu a produção em larga escala e, em meados do século 20, a telecomunicação transformou a forma de trabalhar. Numa fusão desta tecnologia da informação, o mundo digital influencia e afeta o mercado de trabalho em todos os setores da economia – seja em países pobres ou ricos, mesmo que de formas diferentes.
Manter os empregos é um dos maiores desafios da categoria bancária. De acordo com especialistas, a onda se alimenta na reestruturação de cargos e redução de custos com pessoal nas instituições bancárias públicas ou privadas. “Grande parte da população tem aplicativo do seu banco no celular”, afirmou a economista do Dieese/Bancários Cátia Uehara.
No total, o mobile banking já representa um terço das transações bancárias no país, e os números sobre uso digital pelos clientes têm seguido tendência de crescimento.
Impacto no emprego
Ao passo que se investe em tecnologia, acontece uma mutação no perfil ocupacional dos bancos: a maior parte da categoria era representada por escriturários, 43% – sendo a segunda maior ocupação de gerentes, com 28%. Em 2015, o índice de escriturários caiu para 32%, e o cargo de gerência passou para 39%.
Já o Santander só ganha nessa equação. Seu lucro líquido por empregado cresceu 46,6% no primeiro trimestre do ano em relação ao mesmo período de 2016, e o resultado mundial do banco foi impulsionado pelo lucro bilionário obtido no Brasil. No caso de seus trabalhadores, o resultado não é nada positivo: foram fechados 3.245 mil postos de trabalho nos últimos 12 meses (ou seja, sem substituição de pessoal). Na avaliação do Dieese, isso significa que cada bancário fica responsável pelas contas de 765 clientes em média.
Na ponta do dedo
Quem frequenta as agências encara a falta de funcionários para atendimento e problemas decorrentes da sobrecarga de trabalho. Por outro lado, ao abrir o aplicativo do Santander no celular, é possível pedir empréstimos, crédito imobiliário ou renegociar dívidas com a mesma facilidade de quem abre suas redes sociais e interage com amigos pelos aplicativos. Há, inclusive, o incentivo para que o cliente navegue sem gastar seu pacote de dados.
Os bancos têm empurrado clientes para fora das agências, seja para internet, telefone ou caixas eletrônicos. Não há como competir com esta prática, mas o desafio é coexistir.
Para Moisés Marques, professor e diretor acadêmico da Faculdade 28 de agosto, a questão digital é uma revolução sem volta, mas existem alternativas. “De fato, afeta e automatiza o trabalho bancário, mas podemos buscar soluções junto às instituições. A digitalização bancária também aumenta potencial de fraudes e aumenta a necessidade de especialização na área. Vão aparecer outras oportunidades para a área”, acredita.
Na avaliação dos sindicalistas, a tecnologia deve trabalhar a favor da sociedade e não somente para gerar lucro para as empresas. Como, por exemplo, para tornar a redução da jornada de trabalho possível. Rita Berlofa, vice-presidenta da Afubesp e presidenta da UNI Finance Mundial, alerta que esta deve ser uma preocupação de todos e traça um paralelo entre emprego e tecnologia em outros setores da economia.
“Aplicativos sociais como o AirBnb ou Couchsurfing, que oferecem hospedagem mesmo não possuindo quartos como propriedade, têm feito frente ao serviço tradicional. Com o avanço do uso destes aplicativos, as grandes redes hoteleiras como Hilton têm perdido espaço sistematicamente. Imagine só o que estão sofrendo os trabalhadores da área?”, questiona Rita. Os empregos em declínio são, justamente, os do setor de serviços, construção, entretenimento, escritório e administração.
Ainda não estamos preparados para este novo mundo. Para frear o desemprego e a precarização, de acordo com Rita, é necessário o investimento em educação e capacitação, além de garantir a regulação da força de trabalho em conformidade com as Convenções nº 87 e 98 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que versam sobre a liberdade sindical e direito à negociação coletiva. “A voz dos trabalhadores precisa ser ouvida pelas grandes corporações. Nossa tarefa é assegurar que, mesmo com as inovações, todos tenham os mesmos direitos sociais e fundamentais.”