Revista repercute saída de executivo e problemas na integração do Santander
A revista Isto é Dinheiro da última semana tratou da dança das cadeiras que vem ocorrendo no Santander nos últimos meses, e que estão “intrigando o mercado financeiro”.
Intitulada “O que está acontecendo com o Santander?”, a reportagem de Lilian Sobral e Tatiana Bautzer fala sobre a saída recente (3 de março) do executivo José Paiva, que trabalhava no banco há 14 anos. Ele participou de negociações importantes ocorridas depois da instituição espanhola ter adquirido o Banespa.
A matéria faz também retrospecto da mudança de Fábio Barbosa por Marcial Portela na presidência do banco no Brasil.
Aliada ao vai-vém dentro do banco, a reportagem comenta ainda os problemas ocorridos no moroso processo de integração tecnológica entre Real e Santander e as consequentes reclamações que o levaram a ficar bem colocado em rankings nada interessantes.
Em janeiro, a empresa figurou em segundo lugar na lista do Banco Central, que mede o grau de irritação dos clientes, além de ter sido considerada a instituição financeira que mais ignora as queixas dos clientes, segundo levantamento feito pelo Procon-SP, divulgado no último dia 15.
Confira a íntegra da matéria, que foi publicada na semana do dia 16 de março.
O que está acontecendo com o Santander?
Troca de executivos e problemas na integração levantam dúvidas sobre os rumos dos espanhóis no Brasil
Por Lilian Sobral e Tatiana Bautzer
Imagem AFP PHOTO/ Pierre – Philippe Marcou
A sucessão de mudanças no banco Santander vem deixando o mercado financeiro intrigado. Pouco depois de concluir uma integração de sistemas do antigo Real que apresentou problemas, o banco anunciou uma profunda reestruturação em seu primeiro escalão.
O executivo José Paiva, especialista em varejo com 26 anos de carreira e 14 de banco, deixou a instituição. Foi substituído por José Berenguer, que cuidava do atacado e da tesouraria, área que agora ficará a cargo do executivo espanhol Ignacio Dominguez Adame.
A troca foi anunciada na quinta-feira 3, simultaneamente à demissão do economista Alexandre Schwartsman, chefe do departamento de pesquisa econômica. O banco comunicou sua saída para “buscar novos desafios” depois de um bate-boca público com o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli.
Num seminário no Rio de Janeiro duas semanas antes, Schwartsman disse que um dos maiores clientes do banco no Brasil usava “contabilidade criativa”, questionando a efetiva entrada de caixa depois de sua capitalização de R$ 132 bilhões no ano passado. O cargo agora será ocupado por Maurício Molan.
O impacto dos anúncios foi maior porque veio precedido pelo afastamento do presidente Fabio Barbosa de suas funções executivas, em janeiro. O brasileiro que presidiu o banco desde a fusão, em 2007, foi substituído pelo espanhol Marcial Portela Álvarez, homem de confiança do presidente mundial Emilio Botín. Barbosa continua a presidir o conselho da instituição. Outros executivos já haviam saído, como João Teixeira, que estava encarregado da área de médias empresas.
A movimentação na cúpula provocou rumores de que o banco estaria insatisfeito com os resultados do varejo no País, algo negado com veemência espanhola. A versão oficial é de que o objetivo da dança das cadeiras é manter o Santander na rota de um “crescimento determinado e sustentável”.
Alguns observadores dizem que Berenguer, com a nova missão no varejo, seria uma estrela em ascensão ligada ao antigo presidente, Barbosa, o que reforçaria a tese de continuidade da gestão. Declarações do gênero costumam ser padrão em qualquer mudança nos altos escalões. O que há de concreto em meio às especulações?
Há quatro anos, a fusão Real-Santander parecia a senha para dias de glória dos espanhóis no País. Na ocasião, Emilio Botín anunciou que a meta era ser o maior banco privado brasileiro.
O Santander ocupava então o terceiro lugar no ranking, onde continua até hoje, para desgosto de Botín. A compra do Real também marcou uma atitude diferente do banco espanhol em relação a outras aquisições, com valorização do time anterior, como foi o caso de Barbosa, escolhido para a presidência.
Mas o processo acabou sendo mais moroso do que se esperava. Não que seja fácil integrar duas instituições muito grandes no varejo. Entretanto, Itaú e Unibanco, que acertaram sua fusão em novembro de 2008, 14 meses depois que o Santander comprou o Real, andaram mais rápido na unificação das operações.
Em meados de fevereiro, uma onda de reclamações sobre problemas na migração das contas correntes atingiu o Santander. No ranking de reclamações do Banco Central (BC), que mede o grau de irritação dos clientes, o Santander saltou do quinto lugar, em dezembro, para o segundo, em janeiro.
Além do BC, as entidades relacionadas aos direitos do consumidor também registraram os efeitos dos problemas na integração. “O número de reclamações dos nossos associados subiu muito em fevereiro, especialmente durante os dias que se seguiram à migração”, diz Ione Amorim, economista do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec). “Começamos a detectar insatisfação dos clientes desde o início da fusão, mas esse indicador disparou nos últimos dias.”
Apesar de toda a atenção dedicada às marcas, o ponto mais sensível de qualquer fusão bancária é a integração dos sistemas tecnológicos. Além da tarefa excepcionalmente delicada de preservar milhões de dados individuais e sigilosos, o processo força uma multidão de clientes a mudar de hábitos.
“Mudança é algo que só agrada às empresas de transporte de móveis”, diz um executivo familiarizado com a vida interna do Santander. “Para a maioria dos clientes, mudar representa um transtorno, e ninguém fica satisfeito.” O banco reconhece que o processo não transcorreu exatamente às mil maravilhas.
“Ocorreram alguns problemas pontuais”, admite Angel Agallano, vice-presidente executivo de meios do Santander. Mesmo assim, ele diz estar orgulhoso do resultado. “Resolvemos todos os problemas em menos de 48 horas.”
Para Agallano, os percalços já foram superados. “Registramos um pico de atividade na véspera do Carnaval e tudo funcionou perfeitamente”, disse ele. Uma das possíveis explicações para as falhas ocorridas em fevereiro é a grande diferença entre os sistemas do Real e do Santander, que acabou acarretando trabalho dobrado na migração.
A percepção de que o Santander não conseguiu crescer rápido após comprar o Real também está afetando seu desempenho nas bolsas. Desde a abertura de capital da subsidiária brasileira, em outubro de 2009, os papéis do banco caíram 7,7%. No mesmo período, o índice de ações de empresas financeiras valorizou-se 10,3%.
“O Santander não entregou um bom desempenho em 2010, o que acabou frustrando os investidores”, diz Luciana Leocádio, da Ativa Corretora. O Santander tem sido criticado pelos analistas por ser pouco agressivo na concessão de crédito, incomodando pouco a concorrência. “O banco ainda não transformou os recursos do lançamento de ações na expansão dos empréstimos”, diz Daniel Malheiros, da Spinelli Corretora.
Mas o que é visto como um desempenho fraco pelos analistas daqui é considerado um sucesso na reunião de acionistas em Santander. O Brasil superou a Espanha em 2010 pela primeira vez como maior fonte de lucros do grupo.
Enquanto o resultado global caiu 8,5% no ano passado, os lucros no Brasil cresceram 31%. Talvez por isso Botín esteja olhando com lupa a estratégia no País daqui para a frente.
Érika Soares – Afubesp