Novembro é mês de combate à violência contra a mulher, uma epidemia com dados alarmantes no Brasil

A cada sete horas, uma mulher é morta no Brasil pelo simples fato de ser mulher. Na maioria dos casos, nove entre dez, o crime aconteceu pelas mãos de seus parceiros ou ex-parceiros. Os dados assustadores são do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, e os números infelizmente crescem ano após ano apesar de todo o debate sobre violência doméstica que paira na sociedade. Novembro é mês em que a luta contra a violência à mulher é lembrada justamente para trazer o tema à tona e discutir formas de enfrentar o sério problema, e que os casos diminuam em um futuro próximo.
Começamos o texto abordando um dado sobre feminicídio não por acaso: quando falamos sobre violência de gênero, o Brasil figura em tristes rankings. Estamos em quinto lugar na lista dos países (84 países no total) onde há mais mortes em razão da violência doméstica, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). De acordo com registros enquadrados na Lei Maria da Penha em 2018, uma mulher sofreu naquele ano abuso físico de seu companheiro a cada dois minutos.
Engana-se quem pensa que a violência doméstica configura somente agressão física. Com 14 anos de existência, a Lei Maria da Penha prevê que, além desta, a agressão pode ser psicológica – relacionamentos que causem dano emocional por meio de humilhações, manipulação e chantagens -; patrimonial – quando o autor impede o acesso da mulher a bens, finanças e de crescer profissionalmente -; moral – o agressor, na tentativa de desmoralizar a vítima, faz calúnias e difamações – e sexual – toda relação sexual não consentida pela vítima. Em todos os casos, a violência pode ser denunciada.
Não é não!
Os crimes de estupro vêm numa preocupante crescente no Brasil. O Atlas da Violência do Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostra que, em 2018, houve uma média de 180 crimes por dia, e a maioria das vítimas (81,8%) eram mulheres.
O relatório do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) sobre violência contra a mulher explica detalhes dos casos que chegam aos hospitais, em sua maioria crianças de até 13 anos. “Estima-se que, de todos os estupros que chegam à rede de saúde, 70% vitimam crianças e adolescentes. Além disso, do número total de pessoas, mais da metade possuíam menos de 13 anos. Quando o estupro foi de crianças, 32,2% dos casos foram praticados por amigos e conhecidos, 12,3% por padrastos, 11,8% pelos próprios pais e 12,6% por desconhecidos.”
Outro problema grave é a ausência de acolhimento adequado às mulheres quando elas decidem finalmente denunciar. Muitas vezes, são tratadas com frieza e descrédito, desencorajando-as a seguir adiante com o processo. A Justiça também não vem se mostrando preparada para lidar com sobreviventes de abuso. O constrangimento ainda é realidade, e a vítima muitas vezes sofre outra violência de onde deveria receber apoio.
O caso mais recente que ganhou cobertura da mídia foi da blogueira Mari Ferrer, que foi estuprada em uma casa noturna e, após julgamento, o acusado teve uma sentença questionável, a do “estupro culposo”, ou seja, sem intenção de cometer – teoria já refutada por especialistas. No episódio do julgamento, advogados e juiz submeteram a moça a declarações humilhantes quando o réu na verdade, teve tratamento brando.
Bancárias contam com canal de atendimento
Graças à luta sindical, bancárias vítimas de violência podem recorrer a um canal sigiloso de atendimento disponibilizado pelos bancos por telefone. A medida é fruto de acordo firmado em março com a Fenaban. O apoio, principalmente em um período de pandemia em que as mulheres ficam confinadas com seus agressores, é conquista importante. Funcionárias que enfrentam violência em casa geralmente dão sinais que algo não está bem: queda de produtividade, falta de concentração, ausências cada vez mais frequentes, entre outros episódios.
Não se cale
Em sofrimento, são diversas as barreiras que a vítima precisa sobrepor para fazer a denúncia. Mas é importante saber que é possível sair de uma situação de abuso.
Se você estiver passando por violência, disque 180, Central de Atendimento à Mulher, para denunciar. As denúncias são registradas e encaminhadas para os órgãos competentes. A Polícia Civil de São Paulo tem uma página na internet onde é possível registrar ocorrências relacionadas à violência doméstica, exceto casos de estupro onde é preciso ir pessoalmente a uma delegacia. Clique aqui para acessar.
O projeto “Basta! Não irão nos calar”, do Sindicato dos Bancários de São Paulo Osasco e Região, oferece atendimento jurídico, em parceria com a Rede Municipal de Enfrentamento à Violência Doméstica, auxiliando as vítimas em questões cíveis (divórcio, guarda, pensão, danos moral ou estético, entre outras) e penais (medida protetiva e demais ações da Lei Maria da Penha). Vítimas podem denunciar pelo WhatsApp (11) 97325-7975.
Para saber mais
Abaixo, algumas sugestões que estimulam a reflexão sobre o assunto.
Praia dos Ossos, podcast original da Radio Novelo. Em oito episódios, o podcast relembra o assassinato de Ângela Diniz nos anos 1970 e analisa o que é ser mulher no Brasil, onde a vítima acaba no banco dos réus, e o criminoso ganha apoio e fama nacional. Apesar de retratar um crime antigo, percebemos que é um problema atual. Clique aqui para ouvir.
Dossiê Violência Contra as Mulheres, da Agência Patrícia Galvão. O arquivo apresenta um perfil completo sobre a violência, analisando a cultura do feminicídio, a violência contra transsexuais, a relação entre racismo e violência doméstica, entre outros. Clique aqui para ler.
Painel de Violência contra Mulheres. Observatório da Mulher Contra a Violência/Senado Federal. Dados sobre violência contra a mulher a partir de estados e municípios. Clique aqui para ler.
Atlas da Violência, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Clique aqui para ler.
A violência contra a mulher. Relatório do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), de autoria de Cíntia Liara Engel. Clique aqui para ler.
Afubesp