Negócio do ABN com Santander levanta dúvidas sobre futuro do Real
A incorporação do Banco Real, associado à imagem de sustentabilidade, pelo Santander levanta dúvidas de especialistas sobre o futuro de produtos socioambientais, como negociação de créditos de carbono, distribuição de fundos de investimento “verdes”, microcrédito e contas para universitários, além do financiamento de projetos de energia alternativa, como a solar e a conversão de veículos para gás natural.
Em documento aos acionistas, o Santander não menciona como trabalhará esses produtos, que não têm uma divisão específica no Brasil. Os produtos contam com forte apelo no mercado brasileiro, tanto que Bradesco e Itaú seguiram o caminho e desenvolveram equipes para cuidar do assunto.
“Carro-chefe do banco não vai ser. Com certeza esse não será o foco. Mas também diria que eles não vão perder um mercado em que são pioneiros. Na Espanha há um apelo crescente para a sustentabilidade, embora atrasado em relação aos holandeses”, disse Peter Shaw, responsável pela análise de bancos latino-americanos da agência Fitch Ratings.
“O ABN liga bastante para isso [os produtos socioambientais] e vem desenvolvendo há muito tempo, em linha com a matriz. Alguns órgãos multilaterais, como Banco Mundial e o BID [Banco Interamericano de Desenvolvimento] têm linhas especiais de crédito para isso. Se o banco quiser manter o valor adicionado do negócio, tem de preservar as coisas boas. Bradesco e Itaú estão abrindo os olhos para a sustentabilidade”, disse Luis Miguel Santacreu, da Austin Rating.
Executivos cobiçados
Diferentemente da incorporação do Banespa, em que o Santander teve de traçar planos para demissão, desta vez o mercado está muito aquecido e com falta de profissionais de talento a partir dos níveis de gerente de área negócios.
Para Santacreu, da Austin, o Santander corre o risco de pagar caro para não perder profissionais que fizeram a liderança do banco em segmentos como atendimento a grandes empresas, atendimento a clientes de alta renda e financiamento de veículos novos e usados.
Segundo os bancários, 500 executivos de médio escalão deixaram o Real nos últimos meses por conta da incerteza gerada com a venda mundial do grupo. O banco não comenta.
“O Santander pode perder talentos importantes neste momento de transição. A concorrência pode levar os melhores profissionais, pessoas que chefiam áreas inteiras de negócios. Pode acontecer o mesmo que ocorreu quando o BankBoston foi incorporado pelo Itaú no ano passado. Muitos [profissionais] caíram fora no momento em que eram cortejados pela concorrência”, disse Santacreu.
Marca
Outro ponto de discussão é quanto ao fim da marca Banco Real, uma das mais bem trabalhadas pelo marketing brasileiro. No plano de incorporação do Real, o Santander já afirmou aos acionistas que deve extingui-la em até três anos, uma vez que sua estratégia prevê a construção de uma marca única na América Latina.
Para o publicitário Eduardo Tomiya, da consultoria de marcas BrandAnalytics, a marca Santander está “apenas engatinhando” se for comparada com a do Real, avaliada no ano passado em US$ 834 milhões. À época, a marca representava 9% dos US$ 9,266 bilhões de valor de mercado do banco.
“A marca Real está consolidada. Tem uma identidade forte com a sustentabilidade. Para o Santander, falta achar um diferencial que atribua uma identidade”, disse Tomiya.
fonte: Toni Sciarretta – Folha de S.Paulo