Livro analisa crise política e tira quatro possíveis lições
O jornalista Marco Aurélio Weissheimer, da Agência Carta Maior, publicou artigo sobre o livro “Leitura da Crise”. Marilena Chauí, Wanderley Guilherme dos Santos, João Pedro Stédile e Leonardo Boff conversaram com Juarez Guimarães sobre origens da crise e seus desdobramentos. O livro foi lançado pela Fundação Perseu Abramo e “debate caminhos para superação da crise política e para evitar repetição de velhos erros”.
Veja a íntegra do artigo de Marco Aurélio Weissheimer:
A crise política e quatro possíveis lições
A crise política que atingiu o PT e o governo Lula em 2005 já foi objeto de muitos artigos, matérias, teses e hipóteses. O maior partido da esquerda brasileiro atravessou o inferno astral de sua existência e ainda está em fase de elaboração sobre o que aconteceu.
Há um consenso, entre todos aqueles que pretendem tirar lições da crise, que não é possível fingir que não aconteceu o que aconteceu e que, portanto, deve-se refletir e tentar investigar suas causas mais profundas.
Uma boa contribuição neste sentido é o livro “Leituras da Crise – Diálogos sobre o PT, a democracia brasileira e o socialismo”, uma coletânea de entrevistas publicada pela Fundação Perseu Abramo e coordenada por Juarez Guimarães, professor do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e editor do boletim eletrônico mensal “Periscópio”, da Perseu Abramo.
Guimarães escolheu quatro entrevistados para falar sobre a crise política: Marilena Chauí, professora da Filosofia da Universidade de São Paulo (USP), João Pedro Stédile, da coordenação nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), Wanderley Guilherme dos Santos, professor titular de Teoria Política da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e Leonardo Boff, escritor, e um dos principais nomes da Teologia da Libertação.
São quatro olhares diferentes sobre a crise. Diferentes porque partem de lugares distintos e procuram lançar alguma luz sobre aspectos distintos da mesma. Na avaliação de Juarez Guimarães, o livro fornece talvez “a melhor reflexão pública que se produziu sobre a crise vivida pela democracia brasileira em 2005 e os caminhos para superá-la. Defendendo que “a inteligência crítica é companheira inseparável da esperança”, Guimarães acredita que o livro representa um instrumento valioso para pensar sobre o que aconteceu e para evitar que velhos erros se repitam.
Cada um dos entrevistados procura extrair lições da crise. Em cada uma das quatro análises há pelo menos um importante ensinamento sobre o que aconteceu se seus desdobramentos no presente. “A sociedade brasileira vive uma crise de destino, uma crise de projeto. Não basta o governo ficar respondendo se há ou não corrupção. O que é importante é o governo recuperar o debate na sociedade sobre a necessidade de um novo modelo econômico para o país”, defende João Pedro Stédile.
“O PT está no meio da parte mais substancial da problemática do país no curto e médio prazo. “Qual é a versão que o principal partido da mudança no Brasil, que se chama Partido dos Trabalhadores, tem a respeito de si próprio nas suas relações com o mundo privado?”, interroga Wanderley Guilherme Guimarães. “Não pode existir uma ética petista própria e separada de uma construção democrática e republicana das instituições brasileiras”, sustenta Marilena Chauí. “Vale a pena investir esperança no resgate do PT, bebendo do capital de esperança que não se esgota no PT e, por isso, não deixa que a crise vire uma tragédia”, propõe Leonardo Boff.
ORIGENS DA CRISE: VOLTANDO A 1989
Para João Pedro Stédile, as origens da crise remontam a 1989, quando Lula foi derrotado por Collor de Mello nas eleições presidenciais. “A eleição de 1989 é enigmática por que só agora compreendemos que ali decidimos um momento da nossa história e a nossa derrota política produziu um descenso do movimento de massas que tem reflexos até hoje”.
Outro efeito daquela derrota foi uma profunda mudança dentro do PT que, a partir das eleições seguintes, adotaria sucessivas flexibilizações táticas e programáticas. Stédile descreve do seguinte modo o ápice deste processo: “Nas eleições de 2002 tivemos um problema do ponto de vista das esquerdas, já que o controle da campanha eleitoral de Lula foi hegemonizado por uma visão de ganhar as eleições a qualquer preço, e para isso se priorizaram as formas de marketing político, todo tipo de aliança partidária eleitoral, e não se priorizou – até se desdenhou – um debate com a sociedade brasileira sobre que projeto alternativo teríamos necessidade de discutir para colocar no lugar do neoliberalismo”.
O resultado disso, acrescenta, foi que “ganhamos as eleições, mas ganhamos num quadro de disputa eleitoral rebaixado politicamente, em que não houve um debate do projeto”. Em um primeiro momento, observa ainda Stédile, dizia-se que a manutenção das políticas neoliberais era transitória. Mas após alguns meses “percebemos que aquela política não era transitória, mas que havia uma decisão de manter uma política econômica neoliberal”.
fonte: Agência Carta Maior