ELIO GASPARI COMENTA PROPOSTA DE BIER DE RETENÇÃO DOS 40% DA MULTA DO FGTS
ELIO GASPARI
O tucanato deve desculpas ao economista Andrea Calabi. Quem tem memória, lembra. Em fevereiro, o ministro do Desenvolvimento, Alcides Tápias, passou-lhe a faca e obteve de FFHH sua demissão da presidência do BNDES. O Governo explicou que ele vinha se desentendendo com seu superior hierárquico. Pior: falava demais. Na ocasião, o ministro do Desenvolvimento deu uma famosa declaração: “Quando não aprovo algo, chamo a pessoa e digo o que está me desagradando e o que deve ser feito para mudar. Dou duas oportunidades, na terceira, demito.”
Fazendo-se de conta que o Governo não está dividido em facções, Calabi não divergiu de Tápias em coisas essenciais. Discordavam na bijuteria. O Governo deve desculpas a Calabi porque o que acaba de fazer o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Amaury Bier, foi muito além daquilo que o pior inimigo do ex-presidente do BNDES seria capaz de imaginar.
O doutor Bier simplesmente anunciou que o Governo deveria tungar os 40% da multa que é aplicada sobre o valor do FGTS dos trabalhadores em casos de demissão sem justa causa. Faz tempo que a ekipekonômica está de olho nesse dinheiro. Ao final de 1997, patrocinou uma pequena ofensiva acadêmica em torno do tema, mas abandonou o debate para ir cuidar da crise cambial.
A proposta de Bier apareceu dias depois de o Governo ter legislado sobre a tolice da proibição da publicidade de suas divergências internas. O secretário-executivo do Ministério da Fazenda viu-se desautorizado pelo Planalto, pelo ministro do Trabalho e pelo líder do Governo na Câmara. Se Calabi tivesse feito uma coisa dessas, Tápias o teria jogado pela janela e o Planalto diria que seu caso deveria ser tomado como um alerta. (Como fez com o camponês paranaense assassinado em maio, no Paraná). Bier colocou-se na condição que o jornalista americano Murray Kempton atribuiu aos editorialistas: “São as pessoas que depois da batalha descem ao campo para matar os feridos.”
Ele quer criar um empréstimo compulsório para os desempregados. Ilustra-se a proposta com um exemplo:
Imagine-se um trabalhador que ganha R$ 700 numa firma e nela trabalha há três anos. Ao ser mandado embora, tem direito a um mês de aviso prévio, mais o FGTS (equivalente a algo como um salário por ano trabalhado) e a multa de 40% sobre o seu valor. Na melhor das hipóteses, vai para a rua com um pouco mais de R$ 3.000 no bolso. Uma fortuna. Levando-se em conta que o tempo médio de procura de emprego está em 20 semanas, verifica-se que o desemprego custará a esse trabalhador a torrefação de seu pecúlio social.
O doutor Bier acha que isso é pouco. Pretende tungar-lhes a multa (cerca de R$ 800, no exemplo), acorrentando-a à sua conta do Fundo. O Governo quer fazer caixa, mas não lhe passa pela cabeça ir buscá-la no bolso daqueles a quem ceva com a taxa de juros real mais alta do mundo. Pelo contrário. Em matéria de construções fiscais, quer isentar da CPMF o movimento de dinheiro nas Bolsas de Valores.
fonte: AFUBESP