Bancos disputam em leilão o cadastro do INSS
O governo federal está acertando os últimos detalhes do edital de leilão da folha de pagamento do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Atualmente, são gastos cerca de R$ 20 milhões por mês para que a rede bancária efetue o pagamento de 24 milhões de benefícios, que totalizam uma fortuna superior a R$ 12 bilhões mensais.
Com a instituição do novo modelo, a União deixaria de gastar e passaria a receber do banco vencedor do leilão. A expectativa é de que o edital, preparado pelo Ministério da Previdência, INSS, Secretaria do Tesouro Nacional e Dataprev, fique pronto até o final do ano. Hoje é o Tesouro quem paga a rede bancária pelo serviço.
Um dos responsáveis pelas negociações disse ao Correio que a idéia de leiloar a folha de pagamento foi do ex-secretário do Tesouro, Joaquim Levy (leia texto abaixo). O governo percebeu que não fazia sentido gastar quase R$ 240 milhões por ano com um serviço que os bancos teriam interesse em pagar para fazer. “A questão é simples: os bancos têm interesse no cadastro do INSS. Estamos falando de um público potencial de 24 milhões de pessoas”, diz a fonte.
O consultor de bancos Daniel Araújo, da Standard & Poors, explica que a vantagem da instituição financeira é ter acesso ao cadastro de potenciais clientes. Segundo ele, isso faz parte de uma estratégia de longo prazo dos bancos, que precisam aumentar sua base de clientes.
“Os grandes bancos de varejo travam hoje uma verdadeira guerra. E, com a economia melhorando e os juros em queda, o caminho para aumentar a lucratividade é expandir a clientela. Faz todo o sentido”, afirma.
De acordo com o consultor, grandes bancos como Bradesco, Itaú e Santander têm promovido uma verdadeira corrida pela folha de pagamento de estados e municípios. “Se esses leilões têm feito sucesso em escalas menores, imagina com um cadastro de 24 milhões de pessoas.”
Uma das maiores licitações foi feita pela prefeitura de São Paulo, que tem mais de 200 mil servidores. O vencedor foi o Itaú, que pagou pouco mais de R$ 500 milhões. O Santander Banespa também desembolsou R$ 365 milhões para administrar a folha de pagamento da prefeitura do Rio de Janeiro.
Segundo outra fonte, ligada ao Ministério da Previdência, um grande banco privado chegou a oferecer ao INSS a prestação gratuita do serviço. “Se isso aconteceu, é porque é vantagem para o banco”, afirma. “Não faz sentido o governo pagar por um serviço que os bancos têm interesse em fazer.”
Para os aposentados e pensionistas do INSS, o leilão da folha de pagamento não implicará em mudanças. O pagamento dos benefícios continuará sendo feito da mesma forma como ocorre hoje. Aqueles que recebem por meio do cartão-benefício não serão obrigados a abrir uma conta bancária. Quem já recebe por algum banco não terá que trocar de instituição.
“O banco vencedor do leilão irá remunerar a instituição que faz o pagamento”, explica. No entanto, o vencedor terá a preferência entre os aposentados que desejarem abrir uma conta corrente para receber o benefício mensal.
Dos 24 milhões de beneficiários do INSS, cerca de 8,6 milhões recebem em conta corrente. A maioria (15,4 milhões) saca o dinheiro por meio do cartão-benefício. O maior pagador de aposentadorias e pensões é o Banco do Brasil, que opera 23,6% da folha. O Bradesco detêm 19,4%, a Caixa Econômica Federal 14,6% e o Itaú, 10,8%.
Ao todo, 34 instituições financeiras pagam benefícios previdenciários no país. Inicialmente, o governo pensou em leiloar as folhas por estado. Mas o receio de que apenas os estados mais populosos recebessem propostas levou ao fatiamento da folha em lotes com até 1,5 milhão de benefícios cada um.
Para combater as fraudes praticadas por meio do cartão-benefício, o governo poderia obrigar que todos os aposentados recebessem o benefício por meio de depósito em conta corrente. No entanto, a idéia foi descartada. O entendimento era de que o INSS não poderia impor aos aposentados um gasto com tarifas bancárias. Por isso, mesmo após a realização do leilão, o beneficiário poderá continuar recebendo por meio do cartão-benefício.
Bancos
Nos próximos dias, o governo deverá apresentar o esboço do edital à Federação Brasileira dos Bancos (Febraban). No entanto, o modelo que está sendo preparado encontra resistência no sistema financeiro, pois os bancos não querem perder esta fonte de receita. Procurada, a Febraban informou que não iria se pronunciar sobre o assunto antes de ser oficialmente informada pelo governo.
Na semana passada, o ministro da Previdência, Nelson Machado, disse que o modelo de leilão ainda não está fechado, e que não há pressa em promover a mudança. Segundo ele, a maior preocupação do governo é melhorar a qualidade do atendimento aos beneficiários. “Melhorar (a qualidade), aprofundar a segurança do sistema e reduzir custos”, afirmou.
Os números
15,4 milhões – de aposentados e pensionistas recebem benefícios por meio do cartão-benefício
8,6 milhões – recebem diretamente em conta corrente
R$ 1,07 – é quanto o INSS paga por cartão-benefício
R$ 0,30 – é quanto o INSS paga por depósito em conta
R$ 240 milhões – é quanto o Tesouro Nacional desembolsa por ano
Uma idéia de Levy
O principal entusiasta da idéia de leiloar a administração da folha de pagamentos do INSS foi o então secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Levy. A idéia nasceu em reuniões de sua equipe com a da Previdência Social.
Segundo um técnico envolvido nas negociações, o governo resolveu tirar vantagem do crescente apetite dos bancos pelo serviço e economizar na tarifa paga. O governo se inspirou em experiências como a prefeitura de São Paulo.
Levy teve uma passagem marcante à frente da secretaria. Já na transição entre os governos FHC e Lula, o então chefe da assessoria econômica do Ministério do Planejamento se aproximou daquele que seria o ministro da Fazenda, Antonio Palocci.
Sua principal ação no Tesouro foi a melhora do perfil da dívida externa, responsável pelo fato de o Brasil estar muito próximo de atingir a melhor classificação de risco (investment grade). Desde abril, Levy ocupa a vice-presidência de Finanças e Administração do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).
Mais 25 anos de déficit
A redução inédita do déficit do Regime de Previdência dos Servidores Públicos, noticiada na quinta-feira, é o primeiro passo no sentido de zerar o rombo dentro de no máximo 25 anos. A projeção é do economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Paulo Tafner, especialista em Previdência.
fonte: Valor Econômico